30 de setembro de 2012

Desilusões infantis



Eu ainda sou muito menina para amar. Não existe em mim o que é necessário para saber entregar-se a um grande amor. Esse meu paladar de criança ainda não consegue suportar o sabor amargo de uma grande paixão, tampouco de uma grande decepção.
Eu não sei o que fazer quando me vem essa urgência em chorar, e menos ainda quando as lágrimas não vêm, embora eu precise delas. Eu não sei o que fazer quando meu coração aperta, porque me dou conta do quão distante você está de mim. Não sei como devo agir, o que fazer, e tudo isso me assusta. Mas eu sei, e muito bem, que isso é a prova do quão imatura eu sou para o amor - esse meu medo de cair antes mesmo de começar a caminhar, típico de uma criança.
Eu não tenho esse direito. Eu não tenho o direito de te amar, te tentar ser pra você o que você é pra mim , de caminhar ao seu lado como gostaria que você caminhasse do meu. Eu não tenho direito de sorrir com você, chorar com você, amar com você. Eu não tenho direito de ser alguém no seu mundo.
É por isso que eu não vou te contar. Você nunca, nunca vai saber o quanto eu te amo, porque eu sou muito insegura pra me entregar ao amor. Eu desisto de te amar, de te alcançar, de tentar ser pra você o que você é pra mim. Eu desisto de você, antes que você desista de mim.
Porque eu ainda sou muito menina pra amar, e você é muito homem pra me esperar.

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"My feelings were probably just some delusion to begin with, caused by the phenomenon of a usually cold person being just a little bit nice to you, and suddenly seeming like a wonderful person."

- Yoshioka Futaba

Do outro lado da rua.



Um dia, como outro qualquer, pode virar de cabeça pra baixo a qualquer momento.
Disso, eu sabia. Sempre soube, na verdade, e nunca sequer duvidei. Só não esperava que fosse te encontrar depois de tanto tempo, só isso. Pelo menos, não de uma forma tão inusitada, inesperada, sei lá. Dessa forma.
Te vi assim, por acaso, do outro lado da rua. Não era uma distância assim tão curta, e tinham muitos carros passando, mas eu te vi. Com seu olhar preso em alguma coisa que eu sequer me importei em saber o que era, a sua pose de entediado ainda era a mesma. E era óbvio que o seu mau-humor, visível em seu rosto, era devido ao fato de ter esquecido o guarda-chuva, e as gotinhas da garoa caindo em seu cabelo lhe incomodavam. E eu ainda podia apostar que sua camisa estava mal-passada - ou mesmo amarrotada -, e você estava usando uma meia de cada cor.
Não pude deixar de me recordar dessas pequenas coisas. Era quase inacreditável topar com você assim, no centro da cidade, depois de tantos anos sem te ver. Sem falar contigo, ou sequer pensar em ti. Até mesmo os amigos que tínhamos em comum pareciam ter o cuidado de não mencionar-lhe durante nossas conversas casuais, embora eu nunca tenha reclamado. E sequer me proibi de pensar se alguém nesse mundo consegia fazer um café que lhe agradasse ao paladar, além de mim. Se alguém, finalmente, havia aprendido a passar suas camisas, e dobrá-las da forma que você gostava. Se existia alguém, além de mim, que sabia de que lado você gostava de pendurar os cabides no guarda-roupa.
Se havia alguém que me substituia no seu mundo.
Naqueles poucos minutos, do outro lado da rua, esperando o semáforo de pedestres abrir, eu pensei em você. Única e exclusivamente em você. No seu jeito peculiar de falar e gesticular, na sua personalidade amável e nas suas expressões infantis. No quando eu te amei e, provavelmente, ainda amava, em algum lugar do meu coração. E não pude suprimir um sorriso, ao me dar conta de que ainda lembrava de todas as suas manias, tão características, depois de tanto tempo.
Quando a luz mudou de cor, respirei fundo. Passei por você sem me fazer perceber - talvez sequer fosse necessário o esforço, uma vez que seu olhar estava perdido entre as faixas da rua. Quando já estava quase do outro lado, entre o barulho da cidade e os passos dos pedestres, ouvi meu nome. Daquela maneira que só você sabia chamar. E, no entando, não virei. Não procurei seu olhar, seus braços, seu calor. Já havia passado tempo demais para isso.
Ao pisar na calçada, senti essa vontade de te ver, de gastar mais alguns minutos com você. Por muito pouco não te procurei do outro lado, não arrisquei minha vida entre os carros pra te abraçar. Por muito, muito pouco não me deixei levar pelo passado e pelas lembranças. Ali, no centro da cidade, em meio a tanta gente e tanto caos, nossas vidas seguiram seus rumos separadamente, buscando horizontes opostos. O meu dia, no entanto, já não era mais um dia qualquer.

23 de setembro de 2012

Indecifrável

Há muito em mim que não pode ser descrito em palavras. Que não pode ser dito, interpretado ou cantado, mas que diz muito sobre mim.
São coisas passíveis de compreensão, mas não da arte do interpretar, nem do se fazer entender. São coisas que precisam de um pouco mais do que curiosidade do interlocutor, que precisam de um pouco mais do que um bom entendedor. São coisas que precisam de muito mais do que palavras para se fazer entender. Ou talvez sequer precisam delas.
Há muito em mim que é preciso apenas e tão somente entender. E isso é tudo o que se pode dizer a respeito de mim.