23 de setembro de 2014

Sobre mim mesma

Há tanto, tanto ódio fincado neste peito que às vezes me pergunto como pode caber dentro de mim. Só queria que fosse embora, fosse embora...

18 de junho de 2014

Liberdade

Olhava-o deitado no chão, numa posição nitidamente desconfortável, murmurando algo incompreensível. Delirava sob o efeito de remédios - que não deveria ter tomado, mas era capaz de qualquer coisa em nome de sua fantasia de auto-destruição. Sentada em sua cadeira, num canto escuro do quarto, ela observava-o sem silêncio, dia a dia, semana a semana, mês a mês. Já não contava mais o tempo, pois ele se arrastava de forma duvidosa. Temia que, se o contasse, saberia com qual frequência sua sanidade a abandonava.
Os olhos inexpressivos pareciam fitar algum ponto morto do assoalho, tal qual uma marionete sem cordas. Seria facilmente confundida com uma, não fosse o leve, quase imperceptível movimento de seu peito ao respirar. De súbito, ouviu um ruído, e sua cabeça voltou-se lentamente para o corpo estirado no assoalho. Ele murmurava algo sobre estar em seu limite, ou algo sobre morte, mas os olhos voltaram-se rapidamente para algum outro ponto qualquer do cômodo. Ouviu o som de algum pássaro, e voltou-se para a grande janela, observando o céu estrelado. Não precisou procurar muito pelo animal, pousado no galho de uma árvore, como se observasse o luar. Os olhos, até então inertes, brilharam.
Queria ser livre como ele. Queria voar entre as nuvens, sentir o vento no rosto e, acima de tudo, viver. Sentir a grama sobre os pés, sentir o perfume das flores, sentir o sabor a água límpida do rio em sua língua. Queria ser livre. Queria sentir a vida pulsando em suas veias mais uma vez.
Como se repentinamente possuída por uma alma, levantou-se da cadeira. As pernas moviam-se de forma lenta, mas sem tropeços. Caminhou vagarosamente, a pequenos passos, até a parede à sua frente, pousando as mãos frias sobre a vidraçaria - os olhos fixos no pássaro. Sem que se desse conta, os dedos finos deslizaram pela madeira escura e abriram o trinco, permitindo que o ar da noite entrasse numa doce brisa. Houveram ruídos de um outro corpo que se levantava, mas estes não foram capazes de alcançar-lhe os ouvidos. Ela debruçou-se sob o parapeito e, envolta da magia do luar, pôs-se de pé sobre o mesmo. Ouviu o animal cantar novamente.
Uma voz fez-se ouvir-se atrás de si, e voltou-se rapidamente - num relâmpago de realidade - para o homem ali, de pé, observando-a. Num único segundo pôde ver o homem, o quarto, a decoração rústica, as noites insones sobre o travesseiro, as lágrimas sobre o assoalho escuro, a jaula da qual podia ver a vida perdendo-se ao lado de fora. O corpo virou-se, e viu, mais uma vez, o céu. O pássaro. O Luar. O cheiro da grama molhada, a carícia do vento na pele, o gosto da liberdade na boca.
Livre, enfim.
Os braços abriram-se e, na batida de de um coração, ela voou. Soberana de sua essência, voou para o mundo, para a vida, para o descanso de suas feridas.
Livre, enfim.

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Maybe tonight, we'll fly so far away
We'll be lost before the dawn
Before the Dawn, Evanescence

21 de maio de 2014

Socorro

Eu preciso de alguém pra conversar, porque eu não consigo mais lidar com isso sozinha. Eu 'tô ficando louca. Falta um passo pra eu cair desse precipício. Um passo só.
Muito pouco, se querem saber.

15 de maio de 2014

Seu motorista...


Seu motorista, com todo o respeito, preciso lhe dizer: a viagem já não me agrada. A paisagem, que outrora fizera-me tão bem, já não me atrai mais. Já não vejo mais beleza nos verdes campos, no céu ou na brisa que entra pela minha janela. A estrada, seu motorista, está muito mal cuidada, e prolongar a viagem só há de me cansar ainda mais. Por isso, eu encarecidamente lhe peço: pare o mundo, que eu quero descer.
Não me leve a mal. O senhor até que conduz muito bem - o problema é a viagem. A viagem tem me sido muito penosa, seu motorista, como não antes tivera. Não vê que os céus por estas bandas não têm cor? A estrada, com seus buracos e barrancos, já não dá gosto de andar , e os passageiros - ah, os passageiros! - que passam por nós já sequer podem manter uma boa conversa, têm sempre pressa, têm sempre pressa...
Já não tenho mais o espírito para seguir minha jornada. Falta-me a alegria e o prazer da juventude, que de mim esvaíram-se tão depressa. Sequer posso buscá-los em minha terra, seu motorista, pois perderam-se de mim nos caminhos dessa aventura. Não sei onde os derrubei, nem mesmo os vi cair... E a cada tranco, é uma ferida antiga que se abre neste velho coração, quando não uma nova que nasce sobre ele.
Já não posso mais seguir contigo, meu amigo. É preciso que eu fique! E é preciso que você se vá! Aqui, desta vez, nossos caminhos se separam. Eu fico, meu caro parceiro, e você segue em frente sua aventura.
Pare o mundo, motorista, que eu quero descer! Porque se não parar o mundo, do jeito que está, paro eu.

18 de fevereiro de 2014

Instantes Eternos



Segurei forte sua mão antes de soltá-la, porque queria que o calor durasse um pouco mais. Ainda que fosse te ver novamente em algumas horas, eu sempre precisava de mais, quase como se nunca estivesse satisfeita, como se nunca fosse realmente o suficiente. Nosso abraço era sempre mais apertado, porque eu queria que meu corpo derretesse com o seu, nossos beijos mais demorados porque eu queria seu gosto sempre em minha boca. Não importava quantos carinhos trocássemos, quantas horas nos falássemos ou quanto tempo permanecêssemos juntos, nunca era o bastante - eu precisava de mais. Eu preciso de você pra todo o sempre.
Nós vivemos nossa vida como todos os demais. Acordamos, trabalhamos, nem sempre almoçamos juntos, nem sempre trocamos mensagens, nem sempre nos vemos ao fim do dia. Eu não posso te ter durante 24h, nem durante 7 dias da semana, nem durante os 31 dias do mês só pra mim. Você é assim, tão caro, tão amável, tão lindo, que todos querem um pouquinho de você. E me faz tão, tão feliz que, diante de todas essas pessoas tão diferentes, você escolha perder meia hora do seu sono pra me ligar tarde de noite...
Ah, eu queria de durasse pra sempre. Eu e você, nosso amor, nossa vida, nossos beijos, nossos abraços, nosso calor, nossas sonecas, nossas aventuras na cozinha, nossas brigas bobas que terminam em guerra de almofadas e deixam a sala de pernas para o ar. Eu queria que tudo durasse pra sempre... Que você durasse pra sempre. 
Ainda que não exista algo "eterno", eu quero que nossas memórias sejam eternas, que esse sentimento seja eterno. Não "enquanto durar", mas sim dentro do peito. Pra que eu possa lembrar de você durante toda a minha efêmera existência, e que faça isso com um sorriso no rosto.
Senti algo em meu cabelo e te olhei de novo, com uma feição meio estranha. "Eu volto em uma semana, você sabe, não né?" E sorri. Eu sabia. E te abracei forte, de novo, pra que pudesse lembrar ao longo da semana de como eu gostava do seu cheiro. De como seu cabelo era macio e gostoso. E de como eu podia sentir você rindo contra o meu cabelo mais-ou-menos desgrenhado, enquanto sussurrava "eu vou sentir sua falta" pra mim. E te ajudei a pegar suas malas com um sorriso, e te levei até a plataforma com um sorriso. E voltei pra casa sorrindo abobada, simplesmente porque te amo. 
Eu sei que não podemos ter a eternidade. Então que tal tornarmos estes pequenos instantes em algo eterno?