10 de novembro de 2012

Aquela carta

Às vezes, sem nenhm motivo especial, eu me pego pensando nessas coisas que já aconteceram há muito tempo, e que foram esquecidas no passado. Hoje, me lembrei de uma carta, que cheguei a enviar, mas que nunca me foi respondida. Naquela carta, estavam escritos todos os meus sentimentos por você, sobre o que eu pensava deles e o que faria com eles depois de enviá-la. Haviam muitos pensamentos dispersos, argumentos falhos e algumas letras borradas - umas, pela pressa; outras, pelas lágrimas.
Considerei muitas coisas antes de escrevê-la. O que poderia acontecer depois de enviá-la, e o que poderia não acontecer mesmo depois de enviá-la; você seria um covarde, assim como eu, e me escreveria uma réplica? Ou, assim que lesse aquelas linhas mal escritas, viria até minha casa para, olhando nos meus olhos - com aquela sua determinação sem limites estampada neles -, me enfrentar? Apesar de ter pensado em tudo isso, no entanto, sequer me passou pela cabeça que sua opção poderia ser o silêncio - a simples ideia de que essas palavras seriam ignoradas nunca me pareceu uma opção, uma vez que, entre elas, havia muito mais do que apenas palavras.
Sim, havia muito mais entre nós do que palavras. Ainda assim, foi basicamente um conjunto de palavras mal ditas que nos fez desistir de tudo aquilo - do amor, das próprias palavras, até mesmo do "nós". No fim das contas, até mesmo elas foram deixadas de lado, junto com as explicações e justificativas sem sentido que tentávamos sempre elaborar. 
Aquela carta, da qual eu me lembrei hoje, era um misto de tudo isso. Do amor que eu ainda sentia, embora me negasse a aceitar; das coisas que eu ainda queria dizer, embora me recusasse a te ver; do quanto eu te queria comigo, embora sequer conseguisse te olhar nos olhos. Uma despedida e, ao mesmo tempo, uma última medida desesperada de lhe ter de volta. De lhe pedir perdão. Uma última esperança, que ainda existia em um canto muito escondido desse coração - na época, já calejado - de que você entenderia, entre aquelas linhas mal escritas e borradas, esse último desejo. E agora, enquanto te dedico esse tempo e essas linhas, me pergunto se o meu recado subentendido foi lido, e o seu silêncio foi sua resposta.
Hoje, te escrevo essa carta. Não sei mais se este ainda é seu endereço, mal conheço o seu "eu" atual, mas me lembro de você. Talvez esteja casado e com filhos, talvez ainda seja o mesmo galã incorrigível pelo qual me apaixonei, talvez tenha se mudado para a Europa e nunca leia essas linhas - que já não são mais mal escritas. Nestas linhas, não há mais desespero, esperança ou mensagens escondidas - lembranças, apenas. Lembranças daquela carta, que você nunca respondeu.
Não vou perguntar como está, o que tem feito e o que tem passado, pois já não me convém. Espero, no entanto, que ao receber - isto é, se receber - esta carta, leia-a com atenção, pois mesmo as lembranças aqui deixadas me são importantes. Mesmo esse pequeno elo que ainda existe entre nós - ainda que exista só para mim - me é importante. E, mais do que tudo isso, espero, de coração, que não tente entender nada além dessas palavras que lhe escrevo. Para nosso próprio bem, meu e seu.

6 de novembro de 2012

O que resta de mim

Eu não sei quem sou. E, por isso, eu vivo nessa constante busca de mim. Me procuro nos mais distintos lugares, nos mais diversos olhares, e não sei bem ao certo dizer por onde já o fiz. Já tentei me encontrar nos outros, nas coisas, até em mim mesma - mas não há pistas em mim, e nem nos demais.
Cada palavra que escrevo sou eu, e cada texto que redijo é um pedaço de mim. Que se vai, ou que vem? Em algum lugar, eu perdi a capacidade de dizer. Nesse peito, onde bate um coração, não existe emoção, e nessa mente, onde pulsam os neurônios, já não há reflexão. Eu existo, eu respiro e eu tenho noção de minha presença - até mesmo as pessoas sabem de mim. Eu, no entanto, sou vazio. Ocupo lugar sem ocupar, procuro por mim sem encontrar, sinto as lágrimas que não consigo chorar e continuo, com ou sem esperança, a procurar por algo que reste de mim.
O que resta de mim? E, mais que isso: o que me impede de saber? Por que não posso me responder? Onde é que perdi minha essência? Eu me pergunto, com bastante frequência, até. Eu tenho noção da minha situação, eu sei um pouco de mim. Mas não há explicação para esse vazio, esse eco que existe nesse corpo, nessa mente, nesse peito - onde eu sei que bate um coração!
Eu não sei se o que ainda sinto é verdadeiramente meu, tampouco se o que penso me pertence. Olho pra mim e não me vejo, grito por mim e não me ouço e, entre todas essas paredes, não sei dizer se não encontro a saída ou se não a quero procurar. Já não sei nada de mim.
Eu não sei quem sou, embora viva nessa constande busca de mim. Eu sinto o sangue pulsar nessas veias e o ar entrar nesse pulmões, mas, dentro dessa casca, não há essência. O que sei de mim - dessa minha condição de existir - é que sou humana. Mas aquela essência, o que havia de mais humano em mim, a alma que me pertencia, já não está mais. Eu me perdi, e não consigo me encontrar. E essas lágrimas que eu sinto, mas não choro, esse luto que eu conheço, mas não sinto, são coisas que estão além do que essas mãos podem alcançar - e que, de uma forma ou de outra, existem - eu já não sinto mais.
Eu perdi a capacidade de sentir - e, agora, não posso sentir a mim mesma.
Até onde esse corpo suporta essa condição de "existir"?